É Um Real
Um garotinho triste e maltrapilho
De olhar parado, quase sem brilho
Em cujo rosto a fome dá sinal
Perambula na rua atarefado
A erguer as mãozinhas em alto brado
Sabores diferentes, é um real!
Sabores diferentes, é um real
Como grita! Gesticula
Tanto anda
No entanto sua vozinha é tão branda
Que o barulho da cidade o caos encobre
Entretanto o garotinho persiste
Vai gritando
O seu olhar é tão triste!
Inocente, nem sabe que é pobre
Chega a noite
Como ele está cansado!
Garganta seca
Pés doídos
Suado
Tem muita fome, pois nada comeu!
E volta ao seu barraco na favela
Mísera, que tem por luz uma vela
E a mãezinha que espera o que vendeu
O menino adormece
Pobre anjinho!
Amanhã levantará bem cedinho
Voltará à cidade, sem abrigo
Garotinho cansado, sem infância
Que muita gente olha com repugnância
Quanto me entristeço ao cruzar contigo!
Só um real, pedes tão pouco
De gritar e implorar já vives rouco
Pobre de ti por sofrer tanto!
Quisera dar-te tudo que precisas
Quisera afofar o asfalto que pisas
E consolar-te o doloroso pranto
Desejaria apoiar-te nos braços
Embalando-te, amainar teus cansaços
E fazer-te adormecer longo sono
Quisera dar-te a infância que não tens
Dizer àqueles que o olham com desdém
Que és pobre e que teu lar é um abandono
Garotinho que grita: É um real!
Quisera eu também lançar, afinal
O meu brado de alerta e de reclamos
É um real, como é real teu sofrimento
Toda a proteção que te falta, o alento
Está ao nosso alcance e não te damos