Renato e Janne

Renato e Janne


Quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer
Que não existe razão?


Renato abriu os olhos, mas não quis se levantar
Ficou deitado e viu que horas eram
Enquanto Janne tomava um conhaque
No outro canto da cidade, como eles disseram


Renato e Janne um dia se encontraram sem querer
E conversaram muito mesmo pra tentar se conhecer
Um carinha do cursinho do Renato que disse
"Tem uma festa legal, e a gente quer se divertir"


Festa estranha, com gente esquisita
"Eu não tô legal", não agüento mais birita"
E a Janne riu, e quis saber um pouco mais
Sobre o boyzinho que tentava impressionar
E o Renato, meio tonto, só pensava em ir pra casa
"É quase duas, eu vou me ferrar"


Renato e Janne trocaram telefone
Depois telefonaram e decidiram se encontrar
O Renato sugeriu uma lanchonete
Mas a Janne queria ver o filme do Godard


Se encontraram então no parque da cidade
A Janne de moto e o Renato de "camelo"
O Renato achou estranho, e melhor não comentar
Mas a menina tinha tinta no cabelo


Renato e Janne eram nada parecidos
Ela era de Leão e ele tinha dezesseis
Ela fazia Medicina e falava alemão
E ele ainda nas aulinhas de inglês


Ela gostava do Bandeira e do Bauhaus
Van Gogh e dos Mutantes, de Caetano e de Rimbaud
E o Renato gostava de novela
E jogava futebol-de-botão com seu avô


Ela falava coisas sobre o Planalto Central
Também magia e meditação
E o Renato ainda tava no esquema
Escola, cinema, clube, televisão


E mesmo com tudo diferente, veio mesmo, de repente
Uma vontade de se ver
E os dois se encontravam todo dia
E a vontade crescia, como tinha de ser


Renato e Janne fizeram natação, fotografia
Teatro, artesanato, e foram viajar
A Janne explicava pro Renato
Coisas sobre o céu, a terra, a água e o ar


Ele aprendeu a beber, deixou o cabelo crescer
E decidiu trabalhar (não!)
E ela se formou no mesmo mês
Que ele passou no vestibular


E os dois comemoraram juntos
E também brigaram juntos, muitas vezes depois
E todo mundo diz que ele completa ela
E vice-versa, que nem feijão com arroz


Construíram uma casa há uns dois anos atrás
Mais ou menos quando os gêmeos vieram
Batalharam grana, seguraram legal
A barra mais pesada que tiveram


Renato e Janne voltaram pra Brasília
E a nossa amizade dá saudade no verão
Só que nessas férias, não vão viajar
Porque o filhinho do Renato tá de recuperação


E quem um dia irá dizer
Que existe razão
Nas coisas feitas pelo coração?
E quem irá dizer
Que não existe razão?

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