Tiro de Misericórdia

Aldir Blanc / João Bosco

O menino cresceu entre a ronda e a cana
Correndo nos becos que nem ratazana
Entre a punga e o afano, entre a carta e a ficha
Subindo em pedreira que nem lagartixa
Borel, juramento, urubu, catacumba
Nas rodas de samba, no eró da macumba
Matriz, querosene, salgueiro, turano
Mangueira, são carlos, menino mandando
Ídolo de poeira, marafo e farelo
Um Deus de bermuda e pé-de-chinelo
Imperador dos morros, reizinho Nagô
O corpo fechado por Babalaôs

Baixou Oxalufã com a espada de prata
Com sua coroa de escuro e de vício
Baixou caô-Xangô com seu machado de vento
Com seu fogo brabo nas mãos de corisco
Ogunhê se plantou pelas encruzilhadas
Com todos seus ferros, com lança e enxada
Oxóssi com seu arco e flecha e seus galos
E suas abelhas na beira da mata
E Oxum trouxe pedra e água da cachoeira
Em seu coração de espinhos dourados
Iemanjá, o alumínio, suas sereias do mar
E um batalhão de mil afogados

Iansã trouxe as almas e os vendavais
Adagas e ventos, trovões e punhais
Oxumaré largou suas cobras no chão
Soltou suas tranças, e quebrou o arco-íris
Omolú trouxe o chumbo e o chocalho de guizos
Lançando a doença pra seus inimigos
E Nanã Burunkê trouxe a chuva, a vassoura
Para o mundo dos corpos, pro sangue dos mortos

Exús na capa da noite soltaram a gargalhada
E avisaram a cilada pros orixás
Exús, orixás, menino, lutaram como puderam
Mas era muita matraca e pouco berro
E lá no horto maldito, no chão do pendura-saia
Zumbi menino lumumba tomba da raia
Mandando bala pra baixo contra as falanges do mal
Arcanjos velhos, coveiros do carnaval

Irmãos, irmãs, irmãozinhos
Por que me abandonaram?
Por que nos abandonamos
Em cada cruz?

Irmãos, irmãs, irmãozinhos
Nem tudo está consumado
A minha morte é só uma
Ganga, lumumba, lorca, Jesus

Grampearam o menino do corpo fechado
E barbarizaram com mais de cem tiros
Treze anos de vida sem misericórdia
E a misericórdia no último tiro
Morreu como um cachorro e gritou feito um porco
Depois de pular igual a macaco
Vou jogar nesses três que nem ele morreu
Num jogo cercado pelos sete lados

Wissenswertes über das Lied Tiro de Misericórdia von Elza Soares

Wer hat das Lied “Tiro de Misericórdia” von Elza Soares komponiert?
Das Lied “Tiro de Misericórdia” von Elza Soares wurde von Aldir Blanc und João Bosco komponiert.

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